Juntos somos a consciência que transmuta os tempos.
Qualquer coincidência com o tempo linear é mera semelhança.
Aqui todos os dias é "o dia fora do tempo".
Agora celebramos o solstício e o equinócio sem negócio.
O texto, por ser maioritariamente feito de vazio, pode conter tudo.
O texto metaforAmorfosea-nos a hélix.
Grata!

segunda-feira, 23 de maio de 2016

A FORÇA ESTRANHA DE UMA CORPOESIA



"Vai bicho desafinar/o coro dos contentes/let's play that"                                                                                                                                                                                                 
Torquato Neto



As sinestesias são sempre bem-vindas! Excecionalmente, como é o caso em apreço, são mesmo bem-aventuradas, portadoras de epifanias transmutantes e de sintonias afeitas a concordiar os (pres)sentidos. Ao encetar a escrita deste expedito texto de avaliação a  'pudorgrafia', de suzamna hezequiel, me (ou)vi subitamente interpelado  por uma outra "força estranha", cantada pela voz tamanha de Gal Costa. 

Lendo nas horas precedentes os corpoemas do segundo livro de hezequiel, eu já me havia (pres)sentido sedutoramente submetido pela inapelável força estranha de uma corpoética pletórica, pujante, onde pulsa, indômito, rebelde, le sang d'un poète nas veias, artérias e capilares de uma cariátide botticelliana. Força estranha que incita a corpoetisa a entretecer, com palavras que acordam poliédricas, uma tapeçaria-mosaico no meio do caminho, hoje tortuoso, da poesia literária. Uma força, leia-se inspiração, que é estranha porque se origina nas entranhas do corpoético e se projeta, tal como fósforo-foguetão, palavra (ar)riscada e acesa, em direção ao campanário luminário das estrelas. Uma força que, nunca abdicando de ser estranha, por bom fim, em nosso corpo se entranha.

Confirmando os bons auspícios anunciados em 'paradox.sou' (2010), 'pudorgrafia' (2015) se metaforiza numa caixa de fósforos, que suzamna vai (ar)riscando e acendendo, sem ter medo do estranhamento venturosamente deflagrado por estes incandescentes pontos de lume, de luz de iridescente cor poesia.          

Concebidos, escritos, editados no curso de um íntegro e integral pundonor autoral, estes vigorosos corpoemas, na aparência epidermicamente opacos são, na realidade, profundamente hialinos. Pudorgrafias que expõem estar a corpoetisa disponível para continuar a desafiar e a desafinar, com suas paradoxias ontológicas, "o coro dos contentes". Sim, o coro dos que se entregam, submissos, a exangue ortodoxia, a infértil heterodoxia de que enferma a poesia dominante no planeta.
  

Danyel Guerra